Não tenho tempo

Todos nós (quase todos) repetimos como um mantra “não tenho tempo”. Apesar das tentativas de nos organizarmos melhor, sentimos que nos falta tempo para tudo. Mesmo durante o confinamento, quando muitos de nós acreditávamos ter uma generosa provisão de horas, as horas do relógio desapareceram. A que se deve esta escassez endémica de horas que acaba por nos stressar?

Existe esta lei não codificada que diz: “O tempo dedicado a qualquer atividade é inversamente proporcional à sua importância”. Pode parecer estranho no início mas tem a sua lógica. A falta de tempo é na realidade uma falta de prioridades. Tem a sua origem na comodidade, que nos leva a realizar em primeiro lugar o que nos é mais simples. Às vezes a falta de tempo é, no fundo, preguiça: fazemos muitas coisas, exceto as verdadeiramente importantes.

Isto não se comprova apenas no trabalho, na vida familiar ou nos compromissos de vida cristã, mas estende-se à gestão do tempo livre, onde tendemos a preencher cada hora disponível até ao limite. Na sua origem estaria o chamado horror vacui (= horror do vazio). De onde nascem estes receios de abalar os nossos horários? Relativamente aos motivos que nos levam a preencher todos os vazios temporais, assinalemos três:

  • Para tranquilizar a consciência. Ocupamos todo o nosso tempo, no pressuposto de que só o que está “cheio” é valioso. Não fazer nada é uma irresponsabilidade. Esquecemos assim que o vazio é imprescindível para a criatividade, para as novas ideias. Como podemos convencer-nos de que, face às exigências do crescente aumento de tarefas, sentar-se e pensar deve ser uma prioridade?
  • Por vaidade. Existe uma obrigação secreta autoimposta de agradar aos outros ou de brilhar diante deles. Preenchemos as lacunas da nossa agenda com pedidos alheios que não respondem a necessidades reais. Atendemo-las para ficar bem perante quem nos pede ou para exibirmo-nos ou esperando uma felicitação. Pagamos por estas pretensões assolapadas com o tempo.
  • Por medo de nós próprios. Sobrecarregar-nos com ocupações, trabalhar e atender às redes sociais preenchem não só a agenda mas o nosso espaço mental, o que nos impede de pensar. Isso liberta-nos de fazer perguntas incómodas que podem ser resumidas numa: é esta a vida que quero levar? No entanto, tal como advertia Pablo Neruda: “Algum dia, em qualquer parte, em qualquer lugar, indefetivelmente, encontrar-te-ás a ti mesmo e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga das tuas horas”.

Podemos reagir de forma adequada. Há um espaço de reação onde reside a liberdade: Não respondas imediatamente a todas as ofertas ou convites. Leva o teu tempo. E não te culpabilizes por isso.

 

Juan Carlos cmf

(FOTO: Aron Visuals)

 

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