Começar por fazer e praticar, e depois ensinar (Aut 340) É relativamente simples fazer uma síntese da espiritualidade do Pe. Claret, pois, apesar do seu carácter prático e da enorme capacidade de adaptação à diversidade de contextos em que viveu, teve sempre claro o seu objetivo. Desde jovem — especialmente quando lhe passaram os desejos de ser cartuxo — propôs-se como meta de vida santificar a sua alma e salvar as dos outros (Aut 113). A estas, acrescentou, quando esteve no Noviciado dos Jesuítas, o zelo pela glória de Deus (Aut 153). Assim se forma a tríade que mais tarde deixará aos seus missionários como objeto da Congregação e que o acompanhará até à morte.
O carácter pouco abstrato do nosso Pe. Fundador faz com que este objetivo da sua vida espiritual se traduza cedo numa realidade concreta: imitar Cristo Missionário. Apresenta-o de forma muito concisa na definição do Filho do Imaculado Coração de Maria: “Não pensa senão em como seguirá e imitará Cristo a orar, a trabalhar, a sofrer, a procurar sempre e unicamente a maior glória de Deus e a salvação das almas.” E como tudo tem a sua ordem, a configuração do missionário começa por “fazer e praticar, e depois ensinar”.
“Fazer e praticar” são dois verbos que tornam ativa a espiritualidade claretiana e traduzem-se na importância especial que adquirem as virtudes apostólicas como lugar onde se desenvolvem: a configuração com Cristo consiste em possuir a sua pobreza, a sua humildade, a sua mansidão, o seu amor… basta ler os seus propósitos para ver como estas virtudes se repetem. O Pe. Claret não tinha uma espiritualidade intimista baseada numa sensibilidade vazia; antes esforçava-se para que a sua vida refletisse a de Cristo. Mas também não se tratava de uma mera imitação superficial ou fruto do seu esforço. Tinha claro que a graça é participação no ser de Deus, e por isso só teremos as suas virtudes na medida em que nos unirmos a Ele. Ele mesmo escreveu, quando era confessor da Rainha: “Quando rezarmos ou meditarmos algum mistério da vida, paixão e morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, devemos, em espírito, entrar no interior de Jesus Cristo, a fim de participar das virtudes que Ele mesmo praticou nesse mistério.” Assim como nos deixou como meta espiritual, também nos deixou como centro da vida cristã a configuração com Cristo Missionário. Esta reflete-se especialmente nos votos e nas virtudes apostólicas que aparecem no capítulo VI das Constituições: caridade apostólica, humildade, mansidão, mortificação e capacidade de sacrifício (embora estas últimas apareçam sem nome). A nossa espiritualidade busca, de modo especial, a união com o Senhor através de ações concretas que nos ajudam a segui-l’O e imitá-l’O mais de perto.
A importância da configuração com Cristo tem uma consequência evidente: é necessário conhecê-l’O profundamente. Para isso, é preciso recorrer antes de mais nada à Palavra de Deus. Não apenas porque ela nos garante a certeza da fé, mas também porque é o único modo de evitar que outras palavras a substituam. Deste modo, ele diz-nos: “Todo o tempo possível dedicar ao estudo da Sagrada Escritura.” Chama a atenção a frequência com que cita textos das Escrituras. Já desde os inícios da sua vocação missionária, os exemplos bíblicos estimulavam-no a dedicar-se ao anúncio da Boa Nova. Mas o estudo da Palavra não basta; é necessário encontrar-se pessoalmente com Ele. A Eucaristia, a oração mental, a liturgia das horas, o rosário… todos são meios para conseguir manter-se continuamente na presença do Senhor. É comovente a forma como o descreve nos seus propósitos de 1857: “Terei uma capela construída no meio do meu coração, e nela, dia e noite, adorarei a Deus com um culto espiritual. Pedirei continuamente por mim e pelos outros. A minha alma, como Maria, estará aos pés de Jesus escutando as suas vozes e inspirações, e a minha carne ou corpo, como Marta, andará com humildade e solicitude realizando tudo aquilo que conhece ser a maior glória de Deus e bem dos meus próximos.” Oxalá todos nos encontremos com Cristo nessa capela interior e o reflitamos no nosso modo de vida!
Pe. Antonio Ávila Gómez, cmf